Viagem de preconceito

Imagem da internet

Como em todas as férias da faculdade, eu retorno para Minas, minha cidade natal, para passar um tempinho com a minha família. Nesse ano não foi diferente. As férias logo chegaram ao fim e eu precisava voltar para a rotina.

Na rodoviária, sempre compro um bilhete para o banco da janela, torcendo para que o banco do corredor esteja ocupado – tenho esperança de que o meu amor sentará ao meu lado. Naquele dia, o meu amor não sentou. O banco foi ocupado por uma senhora que me contou algumas histórias de sua juventude.

Ela comentou sobre como minha cidade, antigamente, não se parecia em nada com o que eu via agora. “O tempo era mais frio”, ela dizia. Também falou que foi proibida pelo pai de jogar vôlei e, por isso, foi colocada em um colégio interno. Contou como se casou, para onde estava indo e até o que iria fazer.

Eu, como uma boa ouvinte, a escutei. Até que veio a pergunta: o que eu ia fazer em São Paulo?. Como sempre, estufei o meu peito, abri um sorriso, arregalei os olhos e respondi. “Eu estudo J-O-R-N-A-L-I-S-M-O, em Mogi das Cruzes, mas como não tem ônibus direto, tenho que descer em São Paulo”.

A partir daí, a conversa começou a tomar novos rumos. Ela começou a falar sobre como o jornalismo era importante. No entanto, dizia que não aceitava que a mídia quisesse apresentar como normal algumas coisas que não são normais.

Comecei a pensar em onde aquela senhora queria chegar – no fundo, já tinha uma ideia sobre o que ela estava querendo falar e, logo, ela disse.

“Eu não acho certo essas pessoas que ficam agredindo o próprio corpo”, falava ela sobre uma travesti que havia visto no mercadão de São Paulo. “Isso é ridículo. Não tem necessidade de se vestir de mulher, é feio. Se a pessoa não se respeita eu vou respeitar ela? Eu falei na cara ‘dele [da travesti]’ você é ridículo”.

Não me segurei e respondi. “Ninguém é obrigado aceitar, mas é obrigado respeitar”.

Nossa conversa acabou ali. Nós duas continuamos a viagem como estranhas. Infelizmente, tive a certeza: além de ser preconceituosa, agora ela também odiava jornalistas.


Autora: Gabriela Sousa
Revisão: Yasmin Castro

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